Rumo a uma divisa global?

Tendo em vista restaurar a estabilidade financeira, líderes mundiais apelaram ao Grupo de 20 países (G20) para que promovessem uma nova divisa global com base no Direitos Especiais de Saque (DES) do FMI.

Os media apresentaram a iniciativa da divisa global como um processo de construção de consenso, no qual os BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China) participariam no relançamento do sistema monetário internacional.

A Rússia e a China avançaram « propostas », as quais têm sido apresentadas como possíveis alternativas ao dólar. A China propôs a formação de uma nova divisa global baseada na reforma do sistema DES:

« É um plano factível reforma o actual DES e torná-lo uma divisa real de liquidação, um ‘cabaz de divisas » aceite universalmente que substituiria o dólar no cerne do sistema monetário », (Li Ruogu, presidente do Export-Import Bank of China, Reuters, 06/Julho/2009).

A proposta da China não implicava uma grande mudança nas disposições bancárias globais, nem abre um espaço de debate quanto à reforma monetária.

Por outro lado, o presidente russo Dmitry Medvedev questionou explicitamente a composição do cabaz DES e pediu ao FMI « para expandir o cabaz de DES de modo a incluir o yuan chinês, commodities e ouro a fim de que ele amadureça como uma divisa de reserva ».

GEOPOLÍTICA

A geopolítica global provoca um sistema monetário internacional relacionado. O controle sobre a criação de dinheiro é um instrumento de conquista económica.

A invasão e ocupação do Iraque foi para excluir interesses rivais russos e chineses dos campos petrolíferos do Médio Oriente e da Ásia Central.

A reforma do sistema monetário internacional é um projecto das elites financeiras dominantes, o qual é discutido por trás de portas fechadas. É improvável que a Rússia e a China, as quais em grande medida permanecem subordinadas aos interesses bancários ocidentais, venham a desempenhar um papel significativo em funções de banca central ao nível global.

Além disso, esta iniciativa verifica-se num momento em que a confrontação Leste-Oeste, em meio a ameaças veladas dos EUA-NATO contra a Rússia e também a China. O estabelecimento de uma nova divisa global e de um sistema de banca central é um instrumento de dominação económica global que está intimamente relacionado com a agenda militar mais ampla dos EUA-NATO.

Se bem que a composição do cabaz DES pudesse ser modificada ou revissta, é improvável que ao Yuan e ao Rublo fosse permitido desempenharem um papel como o das principais divisas de reserva. O que mais provavelmente ocorreria seria a formação de uma divisa global substitutiva (proxy) baseada em grande medida no Euro e no US dólar. Em resposta à hegemonia Dólar-Euro, a Rússia, a China e os estados membros da Organização de Coperação de Shangai (SCO) podem decidir desenvolver arranjos comerciais bilaterais em Rublos ou Yuan (renminbi).

DIREITOS ESPECIAIS DE SAQUE

Os DES são uma unidade contabilística compósita utilizada pelo FMI e pelo Banco Mundial em acordos de empréstimos com países membros. Os DES são um cabaz de essencialmente quatro divisas principais: o US dólar, o Euro, a Libra britânica e o Yen japonês.

Composição dos DES.

O FMI recentemente apresentou um plano para emitir dívida denominada em DES ao invés de US dólares. Os media apregoaram esta decisão como uma grande inovação, quando de facto as instituições de Bretton Woods têm estado a emitir, durante muito anos, dívida denominada em DES.

« Hoje, os DES têm apenas utilização limitada como um activo de reserva e a sua principal função é servir como a unidade de conta do FMI e algumas outras organizações internacionais. Os DES não são nem uma divisa nem um direito sobre o FMI. São, ao invés, um direitos potencial sobre as divisas livremente utilizáveis dos membros do FMI » ( FMI Fact Sheet sobre os DES ).

O que aconteceria se uma nova divisa global viesse a ser concebida utilizando a estrutura dos DES existente?

Os DES não seriam mais uma unidade contabilística mas sim uma unidade de divisa num cabaz. As funções reais de banca central, entretanto, não seriam necessariamente transferidas para o FMI, elas permaneceriam nas mãos dos quatro bancos centrais constituintes: O US Federal Reserve, o Banco Central Europeu com sede em Frankfurt, o Banco da Inglaterra e o Banco do Japão.

O FMI é uma burocracia que serve os interesses das principais instituições financeiras privadas.

Ainda que o FMI formalmente viesse a ser responsável pela supervisão de uma divisa global, ele não seria realmente responsável pela política monetária. Sob a composição existente dos DES, as funções de banca central seriam divididas entre quatro bancos centrais. Estes bancos centrais são por sua vez controlados por um punhado de interesses bancários privados.

Uma divisa global baseada nas disposições existentes dos DES não mudaria fundamentalmente a ordem monetária global.

Os DES seria uma divisa substitutiva. Sob a actual composição dos DES, o se estaria a negociar é uma aliança entre instituições bancárias estado-unidenses, britânicas, europeias e japonesas, em última análise com o US dólar e o Euro a predominarem.

RIVALIDADE EURO-DÓLAR

Desde o princípio, em 1999, tem havido um choque entre o Euro e o dólar. Na Europa do Leste, a antiga União Soviética, a extensão dos Balcãs na Ásia Central, o dólar e o Euro estão a competir um com o outro. Em última análise, o controle sobre sistemas nacionais de divisas é a base sobre a qual são colonizados os países. Enquanto o US dólar prevalece por todo o Hemisfério Ocidental, o Euro e o US dólar estão a chocar-se na antiga União Soviética, Ásia Central, África Sub-Saariana e Médio Oriente.

Antes da invasão do Iraque, em Março de 2003, havia uma confrontação política entre a aliança franco-germânica e o eixo militar dominante anglo-americano.

Com a eleição de governos pró EUA tanto em França como na Alemanha, parece ter emergido um consenso político em relação à guerra do Médio Oriente. Por sua vez, este consenso respeitante à agenda militar EUA-NATO favorece maior cooperação e integração entre os EUA e a UE nas finanças globais e nos assuntos monetários.

Será que esta « aliança » potencial entre poderosos sobrepondo interesses bancários americanos, britânicos, europeus e japoneses levaria à integração do Euro e do dólar numa única divisa global?

Esta integração levaria a reforçar o controle hegemónico de um pequeno número de instituições bancárias e financeiras globais sobre o processo de criação monetária. Isto, por sua vez, faria sombra às funções dos bancos centrais nacionais, sobrepor-se-ia à soberania dos Estados-Nação e finalmente levaria a uma nova fase da crise do endividamento global.

20/Julho/2009

O original encontra-se em http://www.globalresearch.ca/index.php?context=va&aid=14461

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .



Articles Par : Prof Michel Chossudovsky

A propos :

Michel Chossudovsky is an award-winning author, Professor of Economics (emeritus) at the University of Ottawa, Founder and Director of the Centre for Research on Globalization (CRG), Montreal, Editor of Global Research.  He has taught as visiting professor in Western Europe, Southeast Asia, the Pacific and Latin America. He has served as economic adviser to governments of developing countries and has acted as a consultant for several international organizations. He is the author of eleven books including The Globalization of Poverty and The New World Order (2003), America’s “War on Terrorism” (2005), The Global Economic Crisis, The Great Depression of the Twenty-first Century (2009) (Editor), Towards a World War III Scenario: The Dangers of Nuclear War (2011), The Globalization of War, America's Long War against Humanity (2015). He is a contributor to the Encyclopaedia Britannica.  His writings have been published in more than twenty languages. In 2014, he was awarded the Gold Medal for Merit of the Republic of Serbia for his writings on NATO's war of aggression against Yugoslavia. He can be reached at [email protected] Michel Chossudovsky est un auteur primé, professeur d’économie (émérite) à l’Université d’Ottawa, fondateur et directeur du Centre de recherche sur la mondialisation (CRM) de Montréal, rédacteur en chef de Global Research.

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